Ola pessoal, espero que estejam muito bem! O tema de hoje do blog é uma coisa que atormenta muitos músicos, mesmo sem que eles saibam: as fontes de alimentação. Chamamos de fonte de alimentação toda e qualquer caixinha preta (ou de outras cores) que converte a energia da rede de distribuição (ou simplesmente da tomada) em alguma coisa aproveitável pelos nossos equipamentos.
Muitos de nós negligenciamos esse importante equipamento quando estamos configurando nosso setup, imaginando que é apenas uma "fontezinha" qualquer e tudo bem, que não existe impacto no timbre por causa de algo tão "insignificante". Quem nunca???
Para dar uma visão mais geral de como essas caixinhas funcionam e como elas podem ajudar a melhorar ruídos e outras interferências, gostaria de começar falando da famigerada TOMADA.
Fonte Joyo Power Supply 2 |
A geração e distribuição da energia
Há muito tempo, em uma galáxia muito distante, existiram dois caras geniais, que disputaram o mercado de energia quando as lâmpadas eram apenas pavios de querosene. Esses dois gênios eram Thomas Edison, fundador da GE, e o ultra, master fucking do universo Nicola Tesla. Enquanto Edison apoiava e patrocinava a implantação da Corrente Contínua (DC, do inglês Direct Current), Tesla desenvolvia teses sobre a Corrente Alternada (AC, Alternating Current). A briga foi tão grande que inspirou o nome de uma das maiores bandas da história do Rock, o AC/DC.
Tesla era genial na tecnologia. Edison nos negócios... |
Logo ficaria provado que o sistema de Tesla era muitíssimo superior e mais eficiente do que o de Edison, tanto para geração como para a distribuição da energia. A corrente contínua, para distribuição e geração, estava acabada.
Apesar de não ser eficaz nesses processos, a corrente contínua é amplamente utilizada em circuitos eletrônicos, então como fazer para transformar a corrente AC em corrente DC para utilização nesses circuitos? Eis que surge a Fonte de Alimentação, que nada mais é do que um conversor AC/DC (em alguns casos AC/AC, veremos adiante), que serve basicamente para deixar a tensão e a corrente em níveis utilizáveis por esses equipamentos.
A Tomada
Vimos que a geração e distribuição de energia é toda realizada em corrente alternada (AC), e é esta corrente que está hoje na tomada da sua casa.Posso estar chovendo no molhado, mas acho que todos sabemos que a energia nas tomadas das nossas casas, estúdios e palcos só pode ter duas voltagens, popularmente chamadas de 110V ou 220V. Além do popular mito (que não é mito) de que o choque de 220V "gruda" a pessoa, o que nós pobres mortais sabemos desde a mais tenra infância é que tomada dá choque.
Voltemos ao 110x220. Quando olhamos de perto, a tomada de 110 tem a tensão nominal um pouco maior do que isso, sendo mais correto dizer que o valor é de 127V. Na verdade existe uma matemática um tanto complexa por trás dessa informação, mas o que devemos ter em mente é que só existem as tensões de 127V e 220V.
Pois bem, na sua região deve reinar absoluta uma dessas duas tensões. Caso resolvido? Nada disso. As concessionárias brasileiras obedecem certos critérios de medição, que permitem que a tensão oscile dentro de determinados limites nas casas dos usuários. Na tensão de 127, por exemplo, a oscilação pode ser de 116v a 133V, o mesmo vale para as tomadas de 220V, que podem variar de 201V até 231V.
Não bastasse a tensão, a corrente alternada também tem outra grandeza: a frequência. No Brasil usa-se o padrão de 60Hz, ou seja, 60 ciclos por segundo. Isso significa que a corrente muda de sentido 60 vezes a cada segundo, impressionante não é? E obviamente existe também uma tolerância com a frequência, ela pode oscilar, porém, a oscilação é tão pequena que pode ser desconsiderada.
Tomada modelo "Dilma", assim como a Jabuticaba, só tem por aqui....
Os equipamentos (pedais, pedaleiras, etc)
A maioria dos pedais e pedaleiras do mercado são alimentadas com corrente contínua ou DC. Pedais normalmente usam o padrão desenhado pela BOSS, com alimentação DC de 9 Volts. Os 9V acabaram virando um padrão mercadológico, e somente alguns poucos pedais não utilizam esse padrão, normalmente devido a requisitos especiais do projeto, como pedais valvulados por exemplo.
As pedaleiras já variam um pouco mais, algumas delas sendo alimentadas diretamente em AC, como é o caso dos V-Amp de Behringer e algumas pedaleiras Digitech mais antigas. A Alesis também costuma usar AC como alimentação principal de suas unidades.
Seja por um lado ou pelo outro, salvo se seu equipamento tiver conexão direta para tomada (como é o caso das pedalerias Boss antigas, como a GT3 e GT5 por exemplo), será necessário converter a energia AC da tomada para um AC com menor tensão (normalmente 12V ou 18V) ou DC (normalmente 9V).
A Fonte de Alimentação: a cola que une a tomada e o equipamento
A fonte por sua vez é o elo entre a tomada e o equipamento. Ela tem a função de converter e condicionar a energia que é entregue ao equipamento.
Quando falamos em condicionar isso significa que a fonte tem a responsabilidade de, além de converter a tensão para níveis menos mortais do que os 127 ou 220v, de filtrar essa corrente para garantir a estabilidade e a isolação para o equipamento.
Podemos citar basicamente dois tipos de fontes: as fontes a base de transformadores (ou lineares) e as chaveadas.
Uma fonte linear é alimentada pela tensão da rede elétrica, em 110Vca ou 220Vca, diretamente no primário de um transformador. Neste transformador é necessário que exista um enrolamento para a entrada em 110Vca, outro enrolamento para a entrada 220Vca. A escolha será feita por uma chave seletor. Este transformador é específico para receber a tensão alternada em 60Hz. Por este motivo é grande e pesado. Neste transformador a tensão é reduzida, no secundário para uma tensão próxima a tensão em corrente contínua que se deseja para a saída. A tensão do secundário é então retificada e filtrada. A grande vantagem da fonte linear é sua robustez e simplicidade no projeto.
Na fonte chaveada o processamento da tensão da rede para obtenção da tensão em corrente contínua da saída é todo feito em alta frequência. Desta tecnologia resulta a denominação chaveada: a transformação é feita através de um chaveamento em alta frequência onde a regulação da tensão de saída é obtida variando-se a largura dos pulsos de condução da chave (PWM) ou, em alguns casos, variando-se a frequência do chaveamento (modulação por frequência). Como vantagem podemos citar o baixo volume e peso em comparação com a fonte linear. Por exemplo, o transformador de uma fonte chaveada chega a ser 50 vezes menor que o transformador de uma fonte linear de mesma potência.
Como os custos de produção de uma fonte chaveada hoje são bastante inferiores ao das fontes lineares, estas praticamente desapareceram do mercado, sendo usadas apenas em aplicações específicas.
A Fonte... do ruído
Já ouvi muito a seguinte frase vinda de guitarristas: Rodrigo, quando ligo meu pedal na bateria de 9V ele fica xuxuzinho, mas quando ligo na tomada aparece uma serra elétrica no meu som e eu não consigo mais tocar. E isso piora quando eu ligo mais de um pedal na tomada... Isso acontece com menor frequência hoje em dia, mas ainda acontece muito!
Por que ligar o pedal na tomada pode gerar ruído? Pelo simples fato de que a conversão de AC para DC é feita por um processo que chamamos de retificação, que consiste em transformar a onda em formato de senóide da tomada em uma sequência de picos. Para entender como isso funciona, vamos dar uma olhada em como uma fonte básica é construída:
A maioria das fontes disponíveis no mercado a baixo custo possuem uma filtragem ruim e não tem qualquer recurso de estabilização, resultando em uma onda de saída com a seguinte forma:
Essa oscilação, que chamamos de Ripple é passada aos circuitos eletrônicos dos pedais, que são basicamente mini amplificadores de sinal. Quando a alimentação do amplificador está oscilando, essa oscilação será transmitida para o sinal de saída, já que este é uma fração da tensão de alimentação. Ou seja: se sua fonte oscila desse jeito, seu som também vai oscilar. E o efeito piora quando temos mais carga na saída da fonte (ou seja, mais pedais alimentados por ela...).
E qual é o resultado disso? Um ruído chato de 60Hz ou 120Hz (justamente a oscilação da tensão de alimentação mostrada acima). O pior: as frequências, tanto em 60Hz como em 120Hz, são audíveis, o que significa que você terá um zumbido, ao qual chamamos HUM, e ele é bem irritante, como vocês podem ouvir aqui:
O HUM é um problema exclusivo de fontes LINEARES.
Fontes chaveadas não possuem a base de 60/120Hz. Como elas trabalham em uma frequência bem mais alta, o problema delas é outro, o que chamamos de Hiss. O hiss é um ruído de fundo de alta frequência, parecido com o ruído branco ou rosa usado para timbrar microfones, e pode ser causado pelo processo de chaveamento da fonte, bem como por uma filtragem de saída deficiente.
Um outro problema a considerar é que as frequências dentro de uma fonte chaveada podem passar dos 100KHz, e isso por si só pode gerar ruídos caso os pedais fiquem próximos da fonte (funciona como um rádio de baixa potência).
espero que vocês não fiquem ouvindo ruído rosa por 10 horas!
Linear ou Chaveada? Qual fonte eu devo usar no meu setup?
Você deve estar se perguntando: poxa Rodrigo, então eu devo comprar uma fonte chaveada para meus pedais? A minha resposta para esta pergunta seria: pode ser que sim, pode ser que não, depende do que você vai querer ligar...
Se você vai ligar uma pedaleira digital, como uma Zoom G1 por exemplo, a verdade é que tanto faz o tipo de fonte. As pedaleiras possuem filtros na entrada de alimentação, e com isso aceitam bem praticamente qualquer tipo de fonte.
Já os pedais, principalmente os mais antigos, não possuem qualquer tipo de proteção na linha de alimentação, portanto, devem ter uma fonte de boa qualidade.
Dois fatores para mim são determinantes nesse processo: o preço e o espaço disponível para alocação da fonte no setup. Se você tem um pedalboard grande então não deve se incomodar com espaço para uma fonte linear de grande porte. Olhando pelo lado das fontes chaveadas, provavelmente você conseguirá deixar seus pedais a uma distância segura da fonte para evitar quaisquer chiados e interferências indesejadas. Sendo assim, se espaço não é um problema, basta conferir as boas opções no mercado e comprar aquela que melhor se encaixar no seu pedalboard.
Se você tem pouco espaço, opte por uma fonte linear. Mesmo sendo mais pesada e um pouco maior, você não terá problemas em aproximar pedais dela, o que garantirá que esse tipo de interferência não ocorrerá no seu som. Mas opte por uma fonte de boa qualidade. Cheque os capacitores da filtragem, eles deverão ter 2200uF ou mais, o ideal é trabalhar com capacitores de 10.000uF, principalmente se você usar diversos pedais pendurados na mesma fonte
Quantos pedais posso ligar na mesma fonte?
Esta é outra grande dúvida dos músicos: quantos pedais a minha fonte "aguenta"?
Antigamente os pedais eram bem "gastões", chegando a consumir mais de 200mA, dependendo da unidade. Atualmente os pedais já trabalham com componentes muito mais eficientes, e o consumo médio deles é de cerca de 20mA a 80mA. Sendo assim, uma boa fonte de 500mA pode ser usada com tranquilidade em até 6 ou 8 pedais, considerando que nunca é adequado trabalhar no limite. Eu uso a extrapolação simples de 100mA por pedal, como forma de garantir que a fonte não trabalhará sobrecarregada.
Veja o exemplo abaixo, do Boss SD-1 atual, que consome meros 6mA da fonte de energia:
Manual do Super Overdrive Boss SD-1: Apenas 6mA de consumo! |
Já as pedaleiras tem exigências maiores, e normalmente estão descritas na própria entrada de alimentação. Procure seguir sempre os requisitos do fabricante. A regra é: fonte maiordo que o requisito? OK. Fonte menor? Problemas à vista...
Zoom G1: 200mA é o que o fabricante determina, então é 200mA ou mais. |
Conclusões:
- Uma boa fonte não faz muita coisa para melhorar seu som, mas uma fonte ruim pode destruir completamente seu setup. Tanto em sonoridade, com HUM ou HISS como fisicamente, queimando ou danificando algum componente por má qualidade de filtragem e estabilização
- Linear ou chaveada? Depende da aplicação. Pedaleiras aceitam bem qualquer uma, pedais são mais sensíveis, principalmente os vintage, e podem ter interferência de fontes chaveadas que não sejam bem blindadas. Vale experimentar no pedal board antes de bater o martelo.
- Uma boa fonte é fundamental. Beleza exterior e tamanho pequeno não bastam. Muitas vezes uma boa e velha fonte linar pesada e feia faz o trabalho melhor do que uma linda, mas fraca, fonte chaveada.
Espero que tenham gostado desse post, e espero vocês no nosso próximo tema do blog.
Um grande abraço e muito sucesso!